terça-feira, 21 de outubro de 2008

se a tanto me ajudar o engenho e a arte


“E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis, que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando;
E aqueles, que por obras valerosas
Se vão da lei da morte libertando;
Cantando espalharei por toda parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.”

Comprei o bilhete e fui sentar-me no último lugar do autocarro…Olhava para a minha mãe através da janela…aquele pedaço de vidro que já ameaçava uma separação. Quantas vezes desejei que me dissessem o que fazer e no entanto, agradeço por nunca o terem feito. Ninguém poderia saber, melhor do que eu, o que realmente gostava, ansiava e queria para o meu futuro. Era uma decisão que iria moldar a minha vida e só eu a deveria tomar.
Ali estava eu, a sorrir para a minha mãe como se fosse a pessoa mais feliz do mundo e estivesse segura do que estava a fazer, no entanto todos os meus medos me aterrorizavam e as lágrimas ameaçavam aparecer a qualquer momento. Aguentei… aguentei até o autocarro partir e a minha mão se levantar num último adeus. Não podia mostrar-lhe as minhas dúvidas ou receios, ela acreditava em mim, apoiava-me e o meu dever era provar-lhe que iria valer a pena.
Cheguei a Lisboa, senti-me como se estivesse a ver um filme em versão acelerada: as pessoas a correr para não perderem os transportes, as estradas sempre cheias de carros, ouviam-se buzinas e berros dos condutores, como se estes fossem perder o ultimo voo para a lua, o caos… o mar revolto em dia de tempestade.
Alegrei-me ao pensar que a casa da minha madrinha, onde iria ficar, era perto da escola, não teria de viver toda aquela confusão logo pela manhã.
No caminho para a escola o medo deu lugar à ansiedade, afinal iria conhecer uma das melhores escolas de artes do país…a minha escola. Encontrava-me já perto da entrada quando fui atacada por um vendaval tempestuoso, uma onda repleta de monstros marinhos que só abandonaram a minha nau quando esta já se encontrava irreconhecivelmente colorida. Aí, perguntei-me se os meus velhos do Restelo não teriam razão… será que o meu engenho e arte são suficientes para nadar nestes mares tão revoltos? Tantos me disseram que artes era um curso sem futuro… Refugiei-me, então, nas minhas mais belas memórias: o conforto do meu lar e o apoio incondicional da minha família como quem invoca as ninfas do Tejo e arranjei coragem para lançar as minhas velas ao vento e seguir viagem.
Já navego neste mar há dois anos, a minha nau já passou muitos perigos, já conheceu muitos adamastores, quase naufragou… quantas tormentas… mas tal como os portugueses conseguiram, também eu desejo chegar à minha Índia “se a tanto me ajudar o engenho e a arte”

Ana Pinto, 12º E

Um comentário:

Unknown disse...

muito bom este texto...=) sentimental e profundo